segunda-feira, 29 de novembro de 2010

A bela alma de Charing Cross

Anjos e demônios causavam desastres em sua cabeça. Anjos demoníacos, demoníacos desastres.
Anjos e demônios faziam com que ela passasse as noites lendo, buscando respostas para não dormir, para não fechar os olhos.
"Só sou feliz quando sonho!"
Não queria ser feliz sonhando. Aliás, não queria mais sonhar.
A vida era feita de atividades simples: tirar e colocar o vestido, tocar algumas músicas no piano, cuidar de suas flores, ler calmamente Stendhal, ir ao mercado, ler o semanário.
Mas existiam os anjos e o demônios, que traziam a felicidade, impossível neste mundo, para os seus sonhos.
E ela passava as noites lendo, com velas acesas no quarto para afastar os anjos e os demônios de sua cama.
O suor encharcava sua camisola, como se a febre noturna de um tísico se apossasse de seu corpo.
Lá fora, nas ruas, homens sem reputação caminhavam na madrugada, debaixo da neblina espessa, à busca de prostitutas famintas.
Os demônios que fossem passear lá, com esses homens!
E os anjos também! Que pousassem sua espada pesada de culpa sobre esses pecadores!
E os primeiros raios de sol começavam a brilhar ao longe, dando fim a mais uma noite de desespero. Trazendo para ela a segurança tranquila de mais um dia de sua rotina.
Livre dos anjos, livre dos demônios.

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